Nas últimas décadas os moluscos de água doce têm sofrido taxas de extinção ou declínio acentuadas, sendo os mexilhões de água doce (Ordem Unionoida) e em particular a espécie Margaritifera margaritifera (Linnaeus, 1758) uma das mais ameaçadas em toda a Europa.
Esta espécie habita principalmente rios de montanha, de águas frias e caráter oligotrófico, e atinge uma longevidade significativa. Possui um ciclo de vida complexo, com uma fase larvar parasítica (gloquídio) e uma relação estritamente dependente da presença de peixes nativos hospedeiros da família Salmonidae (Salmo trutta e Salmo salar) (Figura 1). É atualmente descrita como sendo uma espécie indicadora de rios de elevada integridade ecológica onde desempenha funções vitais para o ecossistema, como sejam a capacidade de filtração e depuração da água e a reciclagem de nutrientes.
Figura 1. Ciclo de vida do mexilhão-de-rio, Margaritifera margaritifera.
No entanto, desde o princípio do século passado, assiste-se a um decréscimo superior a 90% dos efetivos populacionais de M. margaritifera na Europa, tendo-se extinguido ou tornada rara em muitos países europeus, incluindo Portugal. As causas para esta redução drástica e mesmo para algumas extinções locais estão normalmente relacionadas com a alteração, perda e degradação do habitat, poluição, regularização de caudais, introdução de espécies exóticas e diminuição dos peixes nativos hospedeiros. Estes rápidos declínios, bem como a classificação de M. margaritifera como espécie chave e indicadora de um tipo de habitat com características especiais (rios de montanha com condições oligotróficas e de baixa perturbação humana), justificam a necessidade de ações orientadas na conservação de M. margaritifera. Acresce salientar que é uma espécie protegida internacionalmente pela Convenção de Berna (Anexo III) e Diretiva Habitats da Comissão Europeia (Anexo II e V), sendo listada como “Em Perigo” globalmente e como “Criticamente em Perigo” na Europa pela Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN) de Espécies Ameaçadas (Cuttelod et al., 2011; IUCN, 2018). A avaliação efetuada no último relatório nacional no âmbito do art. 17º da Diretiva Habitats classificou a espécie como Desfavorável-Mau (U2), com redução dos efetivos populacionais e da área de habitat ocupado.
Atualmente, em Portugal, as populações de M. margaritifera estão confinadas apenas a oito rios pertencentes às bacias hidrográficas do Douro (Sub-bacia do Tua: rios Tuela, Rabaçal, Mente; Sub-bacia do Paiva: rio Paiva, Sub-bacia do Tâmega: rios Beça e Terva) e do Noroeste (Cávado e Neiva) (Figura 2). A presente operação tem por objetivo final inverter o processo de declínio continuado e acentuado das suas populações e proteger e/ou recuperar os núcleos históricos desta espécie, constituindo-se ainda como o plano de referência e orientador para os vários intervenientes no processo, nomeadamente a administração central. A não implementação da operação poderá acarretar perdas irreversíveis para a espécie, nomeadamente nos cinco rios onde ocorre com núcleos populacionais de baixa densidade (Paiva, Beça e Terva, Cávado e Neiva), com consequências muito negativas ao nível da possível perda definitiva da diversidade genética associada a estas populações.
Figura 2. Área de distribuição de Margaritifera margaritifera em Portugal, mais propriamente nas bacias hidrográficas dos rios Neiva e Cávado (Bacias do Noroeste) e dos rios Beça, Terva, Paiva, Mente, Rabaçal e Tuela (Bacia do Douro)